titulo: Os Mitos
Filogenéticos de Freud: Totem e Tabu e Neuroses de Transferência: uma Síntese Justificacao: Faremos uma comparação entre as duas
suposições de Freud sobre a história filogenética que culminam no parricídio
- a suposição apresentada em Totem e tabu (1913) e a suposição apresentada no
manuscrito enviado a Ferenczi, Neuroses de transferência: uma síntese (1915)
- a fim de analisarmos o conceito de cultura dos últimos textos escritos por
Freud e sua relação com a segunda teoria pulsional. Em Totem e tabu, o
parricídio e a subseqüente organização social constituem o marco da passagem da
natureza para a cultura. O pai da horda primeva é o símio, o primata do qual
descendemos e cujo poder se baseia na força. A união dos irmãos para cometer
o assassinato e para garantir que nenhum deles tome o lugar do pai
corresponde à constituição do contrato social, à saída do estado de natureza
e à submissão às leis feitas por eles próprios. No mito contido no manuscrito
enviado a Ferenczi, no entanto, o parricídio aparece como um ato conclusivo
de uma história desenvolvida anteriormente. Na primeira fase dessa história
se constitui a psicologia do pai primevo, aqui visto não como um primata, mas
como um sobre-humano (Übermensch nietzscheano), livre, inventor da linguagem
e formador das hordas devido a sua inteligência; na segunda fase, se
constitui a psicologia dos filhos expulsos da horda, castrados, que,
parece-nos, corresponde a psicologia dos escravos, dos homens fracos, de
Nietzsche. O parricídio, nessa segunda suposição, possibilita a recuperação
das características do indivíduo livre e criativo (do sobre-humano) pelos
filhos iguais e fracos. Além da introdução da idéia da psicologia do
indivíduo e da massa, a segunda suposição exigirá uma nova concepção
pulsional. Se a idéia de sexualidade perversa de alguma forma podia sustentar
a hipótese de Totem e tabu, para a constituição da psicologia dos homens
fracos, da massa, será necessária (o que só ocorrerá em 1920) a formulação da
pulsão de morte, justificadora do masoquismo. Enquanto em Totem e
tabu a constituição da cultura parece corresponder a uma certa libertação do
estado de natureza (apesar da ambivalência para com a cultura), no mito do
manuscrito parece ser mais enfatizado a base masoquista, social,
massificadora, sobre a qual se constitui a organização social. O
interessante, no manuscrito, é o deslocamento da liberdade e da capacidade de
criação para o pai primevo, cujos filhos poderão se identificar parcialmente
(depois de constituída a organização social) mas nunca poderão sê-lo
inteiramente (diferente de Nietzsche, podemos afirmar que para Freud o
Übermensch nunca poderá retornar). A ênfase na psicologia dos filhos
permite-nos compreender a visão, de alguma forma, pessimista de Freud sobre a
cultura, apresentada no Mal-estar na cultura, uma vez que esta se baseia na
culpa e na internalização da pulsão de morte (na auto-agressão, possibilita
pelo super-eu). Pretendemos, portanto,
por meio da comparação dos dois mitos filogenéticos apresentados por Freud,
compreender sua concepção de cultura que será elaborada a partir de 1920 e
que exige uma segunda elaboração da teoria pulsional (exige o conceito da
pulsão de morte). |